• Notícias
  • Seminário aponta desafios e compromissos a serem assumidos pela população do Acre
Seminário aponta desafios e compromissos a serem assumidos pela população do Acre

Seminário aponta desafios e compromissos a serem assumidos pela população do Acre

A Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam) reuniu indígenas, ribeirinhos, agentes de pastoral, sociedade civil, pesquisadores, religiosas/os, seminaristas, padres e bispos no Seminário Laudato Si’, realizado no dia 26 de março, na diocese de Cruzeiro do Sul, Acre. 

No total, foram 126 participantes que olharam para sua realidade, ouviram e trocaram experiências. Ao final do encontro, foi divulgada uma carta compromisso na qual os presentes apontaram os “problemas graves que afetam a região do Juruá e de toda a Pan-Amazônia” e assumiram compromissos relacionados a estes desafios, como os grandes projetos desenvolvimentistas e terra; o narcotráfico; a violência doméstica e o saneamento básico.

Leia a carta na íntegra:

Cruzeiro do Sul, 26 de março de 2017

 

Carta compromisso dos participantes do Seminário Laudato Sì e Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam)
da Diocese de Cruzeiro do Sul, Acre e Amazonas
 

Reunidos em Cruzeiro do Sul (AC), nós participantes do Seminário Laudato Sì, promovido pela Rede Eclesial Pan-Amazônica” (REPAM): indígenas, ribeirinhos, agentes de pastoral, sociedade civil, pesquisadores, religiosas/os, seminaristas, padres e bispos, totalizando 126 participantes, mergulhamos em nossa realidade, ouvimos e trocamos experiências.

A par dos problemas graves que afetam a região do Juruá e de toda a Pan-Amazônia, discutimos: os grandes projetos desenvolvimentistas e terra (1); o narcotráfico (2); a violência doméstica (3) e o saneamento básico (4): 

1) Grandes projetos para a Pan-Amazônia e terra 

A. Referente aos projetos do tipo Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (REDD) que vem se instalando em nossa região, nos perguntamos: Como podemos tirar o sustento sem poder roçar, caçar ou pescar? Ainda apontamos a ausência de clareza nesses projetos, os quais nos causam insegurança pela falta de regularização fundiária.

B. No que tange à questão da terra, estamos preocupados com as vendas indevidas das mesmas, muitas vezes griladas, com a crescente expansão do agronegócio que gera conflitos entre posseiros e fazendeiros, violência e morte. A morosidade dos processos de regularização fundiária favorece o não cumprimento do direito à terra das comunidades tradicionais. O direito constitucional da demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da Constituição Federal de 1988, até hoje não foi cumprido. Ao contrário, está ameaçado com a tramitação da PEC 215.

C. Em relação à exploração de petróleo e gás no Vale do Juruá, a venda do Bloco AC-T8 para a Petrobras em 2013 constitui-se como verdadeira ameaça. Esta atividade, e principalmente a extração de gás ou petróleo não convencionais (fracking), podem contaminar o solo e a água e afetar a vida das comunidades, assim como as demais formas de vida da floresta.

2) Violência doméstica

Constatamos o aumento da violência doméstica, de exploração e abuso sexual. Os atendimentos nas delegacias são falhos. Falta um atendimento humanizado.

 3) Narcotráfico

Preocupa-nos ainda o aumento de crimes violentos e a destruição de famílias em nossa região por causa do narcotráfico. A ausência de proteção e a corrupção facilitam a entrada de traficantes pela tríplice fronteira, em vários casos atravessando as terras indígenas. A região fronteiriça não suficientemente vigiada torna-se também o palco propício para a exploração e o tráfico de pessoas.

Não podemos deixar de manifestar-nos sobre a atual proposta de reforma previdenciária e terceirização que vulnerabiliza, particularmente, os mais pobres e agrava ainda mais a situação de exclusão e perda de direitos na Amazônia. 

4) Saneamento básico

Grandes problemas referentes ao saneamento básico são a inexistência de uma estação de tratamento de água e esgoto em toda região do Vale do Juruá e a ausência de aterros sanitários. Não se cumpre um calendário de coleta de lixo e não há programas de educação para que as pessoas mantenham a nossa Casa Comum limpa.

O papa Francisco expressa um carinho especial aos povos indígenas. O maior número de povos aborígenes no Brasil se encontra na Amazônia. O Papa afirma: “É indispensável prestar uma atenção especial às comunidades aborígenes com as suas tradições culturais. Não são apenas uma minoria entre outras, mas devem tornar-se os principais interlocutores, especialmente quando se avança com grandes projetos que afetam os seus espaços (LS 145). A defesa que o Papa assume em relação aos povos indígenas se estende também aos quilombolas com suas culturas ancestrais.

A Carta Encíclica Laudato Sí nos deu esperança e iluminou na reflexão sobre essa situação precária. “Vivemos já muito tempo na degradação moral, descartando a ética, a bondade, a fé, a honestidade; chegou o momento de reconhecer, que essa alegre superficialidade de pouco nos serviu”, (LS 229).

Reconhecemos, a partir da Laudato Sì, que é imprescindível a tarefa de organismos internacionais e a organização e de nós sociedade civil e Igreja, “na sensibilização das pessoas, na colaboração de forma crítica, inclusive utilizando legítimos mecanismos de pressão, para que cada governo cumpra o dever próprio e não-delegável de preservar o meio ambiente e os recursos naturais do seu país, sem se vender a espúrios interesses locais ou internacionais” (LS 38). 

Comprometidos/as com a defesa da vida na Amazônia e a promoção da paz e a harmonia na Casa Comum, o Lar de todos, assumimos: 

1. Grandes projetos e regularização fundiária 

Exigimos que sejam realizadas reuniões para consulta livre, prévia e informada junto com organizações de apoio de órgãos competentes como: MPF, com base na Convenção 169 da OIT Art. 6º e na Constituição Federal, Art. 231 e 232. Insistimos na conscientização dos riscos da exploração de gás e petróleo e nas denúncias em nível internacional em relação a violação dos direitos à terra.

2. Violência doméstica 

Fortaleceremos e criaremos grupos de famílias vulnerabilizadas pela violência doméstica (ex.: Alcoólicos Anônimos, Grupo Esperança Viva, etc.:), com ajuda da Pastoral Familiar, organizações e especialistas no assunto.

3. Narcotráfico 

Desenvolveremos um trabalho integrado entre igrejas, sociedade e os órgãos governamentais (federais, estaduais, municipais) a nível de fronteira (Peru e Bolívia) no combate a violência e exploração sexual, tráfico de pessoas e ao narcotráfico.

4. Saneamento básico

Exigimos do poder público um plano de saneamento básico e efetivação onde já existe. 

Firmaremos parcerias com instituições para realizar campanhas de educação ambiental, no cuidado com a Casa Comum.

Assumimos esses compromissos porque acreditamos na mensagem do papa Francisco: “A esperança convida-nos a reconhecer que sempre há uma saída, sempre podemos mudar de rumo, sempre podemos fazer alguma coisa para resolver os problemas”, (LS 61).

***
Com informações e foto da CNBB.