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A escatologia da primeira carta aos Tessalonicenses: Jesus Cristo

Os títulos de Jesus na 1ª Carta aos Tessalonicenses.

O Filho de Deus em 1Ts

Quando se fala de “títulos”, entende-se que se aplicam a Jesus. Mas por que “Jesus” não basta? Sua tradução não é “Salvador” (cf. Mt 1,21), designação que seria suficiente para a expressão do que Jesus significa para a Cristologia paulina? Portanto é preciso ver onde “Jesus” aparece sozinho nos escritos paulinos (1Ts 4,14bis; 2Cor 4,10bis.11bis; 4,14 na segunda vez; Fl 2,1 e Rm 3,26), e verificar o que significa. O exame destas ocorrências mostra como o nome “Jesus” não é entendido como traduzido por “Salvador”. Logo o sentido hebraico do nome de Jesus não foi o que São Paulo quis evidenciar, embora fosse claro que para ele Jesus fosse o Salvador do mundo. São Paulo não diz “Jesus salvador”, senão junto de outros títulos, como em 1Ts 5,9; Fl 3,20 e nas Pastorais. Ele quer dizer isto e não só: quer dizer muito mais: este Jesus ressuscitado é Filho de Deus (título “Filho”), é o Messias esperado por Israel (título “Cristo”), é Senhor como o Deus poderoso de Israel (titulo “Senhor”).

O Título de Senhor ‘Kýrios’, em 1Ts

São Paulo não evidenciou por si este título, mas o recebeu da Igreja. Nem foram suas comunidades que passaram a aplicar a Cristo o título de “Senhor”. Por isso São Paulo chama Cristo de “Kyrios”, sem se sentir na necessidade de explicá-lo, supondo nos leitores familiaridade com este título. “Senhor” vinha a tradição litúrgica cristã antiga para invocar o Filho de Deus, Cristo. Estaria aqui em forma embrionária uma devoção a duas pessoas divinas, sem ainda atingir uma conceitualização da Trindade. O importante aqui é que a comunidade primitiva vê em Cristo os sinais da divindade que reconhecia no Deus de Israel, sem porém negar o monoteísmo herdado da fé judaica. 1Ts 3,13 (cf. Zc 14,5); 4,6 (cf. Sl 94,2) são empregos deste título transferindo para Jesus o que o AT atribuía somente a Deus Pai [ver também 2Ts 1,7-8 (Is 66,15); 1,9 (Is 2,10.19.21); 1,12 (Is 66,5)].

Para os Cristãos que aceitam Jesus Cristo como Senhor, este título designa:

a) O Senhor Escatológico: aquele que por agora é esperado na Parusia, e por isso o título é seguido de palavras como: ‘a Parusia do Senhor’, em 1Ts 2,19; 3,13; 4,15; 5,23.

b) O Senhor que não condena mas salva: aquele que a comunidade e o apóstolo esperam como Salvador e não juiz para condenar: 1Ts 1,3; 5,9 e 5,28.

c) O Senhor que na Parusia efetuará completamente a Salvação: 4,15.15.16, e nos porá a seu lado, salvando-nos: 4,17.

O Título de Ungido ‘Cristo’, (Cristo Jesus) em 1Ts

São Paulo combina “Christós” com “Senhor” (1Ts 1,1; cf. 1Ts 5,23.28), ou com “Jesus” (1Ts 2,14), sem mais explicações. O fato é que para ele “Christós” já passara a ser mais do que título; era um novo nome para Jesus. E assim o fará em outras cartas.

Notável porém é que São Paulo também herda da comunidade primitiva este título, com significado soteriológico (pela Morte e Ressurreição, cf. 2Cor 5,14-21) e escatológico.

São Paulo não sente a menor necessidade de explicar por qual motivo chama Jesus de Cristo, porque ninguém duvidava que Jesus era o Messias. Porém o Messias que Jesus é não corresponde à mentalidade judaica, uma vez que São Paulo afirma que foi crucificado (1Cor 1,23; Gl 6,14), morreu, ressuscitou e foi exaltado acima dos poderes celestes, e deste modo se tornou salvador.

Nas sete epístolas consideradas autênticas de São Paulo a freqüência do título ‘Kýrios’ é de 189 ocorrências, enquanto que ‘Christós’ ocorre 270 vezes. Como então, em 1Ts há tanta desproporção entre os usos de ‘Kýrios’ e ‘Christós’?

Esta desproporção explica-se pela ênfase que São Paulo dá na carta ao tema da Parusia, para o qual era imprescindível a imagem soberana e poderosa do ‘Kýrios’.

São Paulo usa ‘Christós’ para fundamentar sua autoridade apostólica: 2,7: ele e seus companheiros são ‘apóstolos de Cristo’. É mais do que ser um simples tecelão de tendas apenas chegado à cidade.

A expressão ‘em Cristo’, em 1Ts.

Aparece em 1Ts 2,14; 4,16 e 5,18.

Dá a firme convicção de um relacionamento entre a comunidade e Cristo como formando uma unidade que mais tarde São Paulo chamará de “corpo de Cristo’, a Igreja.

Em 1Ts 2,14 esta expressão lembra a primeira frase da epístola, 1,1, em que São Paulo falava, na saudação inicial, de sua pertença, como dos tessalonicenses, a ‘Deus e ao Senhor Jesus Cristo’.Em 4,16, são os que, porque confiantes e pertencentes a Cristo, morreram ‘em Cristo’. Em 5,18 esta pertença a Cristo conduz os cristãos ao Pai quando fazem ação de graças.

Enquanto ‘Kýrios’ permanece um título honorífico, e como tal nem sempre é possível trocá-lo pelo de ‘Cristo’, este no entanto tem um uso tão grande que parece ser equivalente àquele. S. Paulo mesmo os combina em 1Ts 1,3; 5,9.23.28.

Em 5,18 a expressão ‘no Cristo Jesus’ vê em Jesus o ungido de Deus, através do qual os tessalonicenses devem dar graças a Deus.

Deus deu a Salvação a partir da sua Morte e Ressurreição (1,10): o Jesus Histórico, o Ungido de Deus = Cristo, que morreu e ressuscitou para salvar os homens da ira divina (1,10), para que vivam, ressuscitados, com Ele: 5,8-10.

Portanto o Cristo Jesus é aquele que Deus ressuscitou para que sua Ressurreição fosse dada aos tessalonicenses.

Esta Salvação dada no Jesus que ressuscitou, enquanto Cristo, terá sua realização para os tessalonicenses em virtude do poder que como ‘Kýrios’ este mesmo Cristo Jesus tem para salvar da ira futura.

Portanto o ‘Christós’ é aquele mesmo Jesus, o Ungido, mas agora considerado em seu poder de efetivar a Salvação.

O título ‘Christós’ revela a perspectiva escatológica de S. Paulo, porque a morte e Ressurreição do Cristo são o evento definitivo da Salvação escatológica.

No conjunto do escrito paulino o uso do título ‘Christós’ indica, portanto, o Evento-Cristo total, com tudo o que significa para a consumação apocalíptica da história.

O Título de Filho “Yiós’ em 1Ts

Mesmo aparecendo apenas em 1Ts 1,10 este título tem um grande significado para a Teologia paulina. No NT é a primeira vez que Jesus é dito Filho de Deus.

a) De fato aqui se trata do relacionamento do Pai, Deus Vivo e Verdadeiro, com o Filho, que morto, foi ressuscitado pelo Pai e como tal revelado como Seu Filho: como o Pai ele vive.

b) Por meio deste título São Paulo quer dar a entender que Jesus, o Cristo, está intimamente relacionado com o Pai que passa a exercer as funções do Pai no relacionamento com os homens, pois só o Filho se fez Homem e não o Pai nem o Espírito Santo, especialmente a função de Salvador.

c) Neste sentido, o Pai todo poderoso, é Senhor para salvar;

Tal poder será expresso por São Paulo através do título de ‘Kýrios’.

E este poder de salvar o Pai dá ao Filho, e, assim o título ‘Filho’ cede lugar ao de ‘Kýrios’ em 1Ts: em vez de chamar Cristo de ‘Filho’, aqui S. Paulo já o chama de ‘Senhor’, igualando-o ao Pai. Isto leva a uma outra conclusão: ‘Kýrios’ exprime a divindade de Jesus, o Cristo, o Filho que, tal como Deus Pai é Deus: com poder, e poder para salvar.

Conclusão

O evento Cristo é expresso por meio dos Títulos de Cristo, dos quais se sobressai o de ‘Kýrios’.

1Ts trata de Jesus Cristo, o Senhor em vista de seu significado como Nosso Senhor numa Cristologia funcional, escatológica e soteriológica.

Tanto o título de Filho como o de Senhor e de Cristo conduzem a uma só conclusão sobre o Jesus anunciado por São Paulo: Cristo é o acontecimento na história dos homens pelo qual a Salvação é dada a todos.

Em 1Ts sobressai o título de ‘Kýrios’ porque com ele São Paulo afirma com maior força a idéia principal de sua epístola:

– O Kýrios é o Filho de Deus, chamado com o mesmo título do Pai, porque recebeu dele o mesmo poder de Salvar,

O Kýrios é aquele que a Igreja aguarda na Parusia. O Kýrios é aquele de quem São Paulo sai pelo mundo anunciando a boa nova: Evangelho do Senhor.

Estes títulos nos permitem depreender o impacto da pregação de São Paulo aos gentios de Tessalônica. Para eles o anúncio do advento de Cristo na história dos homens foi o fator determinante para a transformação radical de suas vidas e existências. Cultura, Religião, Ética, cosmologia, enfim tudo, passou por uma transformação radical, dando origem à Igreja primitiva da Macedônia.

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Pe Selésio Petri
Presbítero da Diocese de Colatina, atualmente pároco da Paróquia do Bom Pastor – Linhares-ES. Mestre em Teologia Bíblica na Pontifícia Studiorum Universitas a S. Thoma. Aq. in Urb (Angelicum)
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